Os radares meteorológicos de bordo são equipamentos extremamente úteis e muitas vezes indispensáveis, como em vôos VFR noturnos ou IFR, principalmente em tempo adverso. Os radares são os olhos do piloto e o principal recurso para tomada de decisão de desvios em rota por questões meteorológicas.

Apesar de desenvolvido e aplicado na aviação há décadas como um equipamento básico de segurança de voo, o radar e sua utilização imprecisa são fatores contribuintes em diversos acidentes e incidentes, desde casos da aviação geral de pequeno porte até conhecidas tragédias em grandes jatos de linhas aéreas.

Para citar dois grandes casos conhecidos, temos o longínquo acidente do Southern Airways, voo 242 de 1977, onde um DC-9 precisou realizar um pouso forçado em uma rodovia nos Estados Unidos depois do apagamento – flameout –  dos dois motores por ingestão excessiva de gelo e água. O resultado da catástrofe: mais de sessenta mortos e vinte feridos. A tecnologia da década de 1970 certamente não se compara a atual, porém, um caso semelhante em suas causas foi o recente acidente do Airbus 330-200 no voo 447 da Air France em 2009, onde todos morreram após a colisão com o mar depois da perda de controle e estol da aeronave. O principal link entre os acidentes foi justamente o erro de interpretação do radar meteorológico, e por consequência, a incorreta tomada de decisão no momento do desvio.

Airfrance 447 acidente meteorológico

Imagem do acidente do Airbus A330 do Airfrance 447

O mais alarmante porém, é o fato de que a grande maioria dos acidentes por causas meteorológicas – 88% de acordo com a FAA – ocorrem na aviação geral/executiva (Part 91), e são consideravelmente menos noticiados e estudados.

 

Mas por que os radares levam a acidentes?

A partir da compilação de diversos relatórios finais de acidentes, onde a má utilização do radar aparece como fator contribuinte, é possível chegar a um ponto em comum: a falta de conhecimento e habilidade em sua operação.

Um fato é que na formação básica de um piloto comercial, que conta com a teoria e prática para navegar em condições e em regras de voo por instrumentos, não existe o estudo para a operação dos radares. Muitas vezes os pilotos tem seu primeiro contato com o equipamento na primeira vez em que operam aeronaves mais complexas, quando já estão trabalhando na aviação geral, táxi aéreo ou linha aérea.

A falta do ensino formal no tema acaba levando ao aprendizado informal, que muitas vezes carrega manias e teorias falsas, e passa a impressão de que a operação dos radares é muito mais simples do que ela realmente é.

Alguns mitos comuns em relação aos radares meteorológicos mas que são completamente sem sentido, são por exemplo:

  • “…a cor verde no radar quer dizer que é seguro, que se pode penetrar…”
  • “…o radar mostra nuvens no display…”
  • “…o radar serve para realizar penetrações em tempo adverso…”

entre várias outras informações incorretas.

 

O que o piloto deve saber para operar bem um radar?

A principal função dos radares meteorológicos é apresentar a informação necessária para a tomada de decisão de desvios de formação. Mas para que a tomada de decisão seja correta é necessário que o piloto saiba operar e interpretar as informações precisamente. Para isso, ele deve conhecer muito bem 4 itens principais: a leitura do display/tela do radar, o ajuste correto da antena, limitações do equipamento e as técnicas de desvio.

 

Leitura do display

A leitura e interpretação das imagens – ou alvos – de um display são extremamente importantes. Um piloto deve interpretar uma imagem de radar como um médico analisa uma imagem de Raio-X, com precisão e conhecimento. E como as imagens de raios-x, as do radar são de difícil interpretação, principalmente para pilotos com pouca experiência.

A interpretação das imagens vai muito além de compreender as cores. O piloto deve compreender os formatos, tamanhos e características específicas dos alvos apresentados, sempre utilizando outras informações e outros recursos/aviônicos para uma análise mais ampla.  

Um exemplo é o formato conhecido como Hook ou gancho, destacado na imagem abaixo. O gancho é uma indicação de formação convectiva e instabilidade, que normalmente é uma região com fortes ventos ascendentes e cortantes de vento – windshear – que resultam em turbulência moderada a severa, mesmo quando em cor verde.

 

Imagem do radar meteorológico de bordo

“Hook” ou “Gancho” no display do radar

Ajuste da Antena

Mesmo conhecendo bem e conseguindo interpretar o display, é necessário que a antena do radar seja posicionada da forma correta pelo piloto. O principal controle de comando da antena é conhecido como “Tilt Angle”, ângulo no qual a antena irá se posicionar para realizar a sua varredura do céu. O ajuste errado do TILT, mesmo que por poucos graus, pode levar a uma imagem totalmente diferente no display, levando a uma interpretação errada e uma possível penetração em tempo adverso.

As técnicas de ajuste do ângulo de TILT são relativamente fáceis na teoria, mas complexas na prática. Além de muito estudo, é necessário que o piloto exercite os conhecimentos práticos operando os radares em diversas situações de tempo.

 

Limitações do equipamento

Supondo que o piloto compreenda muito bem os ajustes da antena e a interpretação do display, mas que não conheça todas as limitações do equipamento que está operando, de pouco adianta. A maioria dos acidentes relacionados com a falha de operação do radar estão ligados a falta de compreensão de suas limitações.

Os radares, por mais modernos que sejam, apresentam anomalias e distorções que dificultam sua interpretação. Algumas das principais são:

  • Ground Clutter (o retorno do solo), que torna difícil para o piloto distinguir o que é formação meteorológica do que é um retorno causado pela interferência com o terreno.
  • Atenuação, que ocorre quando uma formação “esconde” ou atenua outras formações.
  • Distorções de distância e foco, que são distorções na imagem do radar que mostram alvos (CBs, por exemplo) com tamanhos e formatos diferentes dependendo da distância em que se apresentam da aeronave, levando a interpretações equivocadas.
Imagem de radares meteorológicos de bordo

Ground Clutter ou interferência com o solo/terreno

Desvios de formação

Por fim, um dos conhecimentos mais relevantes é o de tomada de decisão baseado nas informações do radar. Não adianta interpretar bem o radar e não saber realizar desvios de forma segura.

Para realizar os desvios da melhor forma possível é preciso compreender como funcionam os sistemas de tempo adverso como os CB’s. Compreender o entorno das formações e a influência do vento nos desvios também é muito relevante.

Muitas aeronaves já passaram por situações severas ao realizar desvios da forma incorreta. Para uma noção de ordem de grandeza, saiba que é possível encontrar granizo, gelo, descargas elétricas e outros fenômenos a mais de 20 milhas náuticas de um CB, em regiões “limpa” de alvos no radar.

 

Como me preparar para a utilização do radar?

Como não é ensinado nos cursos básicos e existem poucos materiais a disposição, o aprendizado da operação do radar é desafiador.

Assim como as aeronaves possuem o POH (Pilot’s Operating Handbook) –  manual de operações – os radares meteorológicos também o possuem. É indispensável que antes de operar qualquer equipamento dessa natureza você tenha lido e compreendido todas as informações contidas no manual. A experiência e conhecimentos práticos conquistados com a ajuda de colegas de profissão com as habilidades necessárias também é uma forma interessante e indispensáve de aprendizado.

A Lift Aviation, escola online de especialização de pilotos, possui um curso online com mais de 20 videoaulas sobre todos os aspectos relevantes que você precisa compreender para começar a operar radares com precisão, onde é ensinado: técnicas de utilização, interpretação das imagens, operação de todos os comandos e controles básicos, limitações dos equipamentos, técnicas de desvios de formação, recursos extras e muito mais. Clique aqui para saber mais

Independente da forma de estudo, tenha em mente que as habilidades e competências referentes aos radares meteorológicos são de extrema importância para todos os pilotos, independente da aeronave ou fase da carreira em que se encontra. O piloto que domina o radar opera com mais segurança, eficiência e conforto.